8 – Título do trabalho
ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO SOB O ENFOQUE DA PSICOTERAPIA CORPORAL: UMA CLÍNICA EM CONSTRUÇÃO
Ana Celeste de Araújo Pitiá
Doutora pelo Programa Interunidades de Doutoramento da Escola de Enfermagem da USP – Ribeirão Preto – SP; Mestra em Enfermagem Psiquiátrica pela Escola de Enfermagem da USP- Ribeirão Preto, Psicoterapeuta Corporal Neo-Reichiana, com formação no Instituto Neo-Reichiano Lumen de Ribeirão Preto, Treinee internacional em Análise Bioenergética pelo The International Institute for Bioenergetic Analysis Suíça (4º ano), através da Sociedade de Análise Bioenergética Lumen de Ribeirão Preto. Curso de Acompanhante Terapêutico – 1997.
Manoel Antônio dos Santos
Psicólogo, Doutor pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, Mestre em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, Professor Doutor na FFCLRP-USP Ribeirão Preto (Departamento de Psicologia e Educação).
RESUMO
O propósito deste trabalho é apresentar uma síntese da Tese de Doutorado defendida em 2002 pela primeira autora, sob a orientação do segundo autor, junto à Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo. Neste estudo, propomos pensar a clínica do Acompanhamento Terapêutico (AT) como uma prática de atendimento que acompanha a pessoa em dificuldade de relação psicossocial no lugar em que ela esteja, seja em casa, na escola, no trabalho, nas ruas ou shoppings, etc. O objetivo terapêutico é romper seu isolamento e exclusão do convívio social. Os clientes podem ser portadores de transtornos ou deficiências mentais, ou outras condições que demandem esse tipo de atendimento. Trata-se de uma clínica extra-muros, isto é, que se dá fora dos hospitais, consultórios e clínicas, servindo de apoio a esses serviços. É a chamada clínica da cidade, em que acompanhante terapêutico (at) e acompanhado (cliente) percorrem os espaços comunitários possíveis no alcance do objetivo da ressocialização, processando o vínculo terapêutico que se estabelece na relação entre ambos. Uma característica dessa prática é a possibilidade de ser referenciada teoricamente por múltiplos olhares. No presente estudo, o enfoque da psicoterapia corporal, mediante o conceito da auto-regulação proposto por Wilhelm Reich, coloca luz na análise dos acompanhamentos. Como objeto de estudo temos a questão: de que maneira pode ser praticada a clínica do Acompanhamento Terapêutico, em seu processo de construção, tendo em vista o enfoque da psicoterapia corporal, objetivando a auto-regulação social do cliente acompanhado? Dentro do quadro referencial privilegiado, pretendemos contribuir para a ampliação do campo de reflexão sobre a prática clínica do AT, abrindo espaço para outras discussões e novas possibilidades da ação do profissional de saúde. Valendo-se da descrição de um atendimento em AT, será discutido o conceito de movimento, configurado pelo ato de acompanhar, corporalmente, o portador do sofrimento psíquico e que se torna parte integrante dessa clínica extra-muros. O ato de acompanhar já guarda, em si, uma dimensão corporal, que se estabelece na condução dos atendimentos a partir dos corpos do acompanhante e do acompanhado, dispostos lado a lado no contexto vivo da interação que se instaura na clínica do AT. A auto-regulação social dos acompanhados pode ser vista e considerada a partir do resgate de suas potencialidades no manejo dos desafios da vida cotidiana e da retomada de suas relações no trabalho e na família.
Introdução
O Acompanhamento Terapêutico (AT) é um trabalho que se constituiu como função específica na Argentina, em meados da década de 70, a partir da experiência de tratamento de pacientes psicóticos em terapias de abordagem múltipla. O acompanhante terapêutico (at) era integrante de uma equipe multidisciplinar que se compunha de psicoterapeuta, psiquiatra, terapeuta familiar e acompanhantes terapêuticos. Partia-se do princípio terapêutico segundo o qual é necessário abordar os pacientes em todos os aspectos de sua vida diária, tentando criar-lhes um meio ambiente favorável ao seu restabelecimento. Para criar esse contexto, o at participava ativamente de diversos grupos a que os pacientes pertenciam, visitando suas casas, conhecendo seus amigos, reunindo-se com diretores de escolas quando fosse oportuno (MAUER & RESNIZKY, 1987).
A título de definição, o termo acompanhante terapêutico (at) designa o profissional que abriga a característica de acompanhar o cliente, encontrando-se articulado com os demais profissionais envolvidos no atendimento. A ênfase de sua função terapêutica recai na possibilidade de favorecer um “modelo de identificação” para o paciente por intermédio da função de “ego auxiliar” (BERGER, 2001).
Assim, o Acompanhamento Terapêutico (AT) se constitui como uma atividade clínica que objetiva romper com as barreiras que dificultam a relação com o ambiente social em que se encontram pessoas portadoras de transtornos psicóticos, deficiências físicas e mentais, ou mesmo que estejam vivenciando outras situações nas quais estejam comprometidas suas atividades cotidianas.
Referencial teórico-conceitual
A referência teórica que sustenta a prática do AT está intimamente relacionada com a dinâmica própria dessa clínica. A proposta terapêutica segue na direção do resgate da identidade social de pessoas em crise, refletida por suas atitudes psíquicas e psicológicas impressas no corpo e que denotam isolamento e perda de comunicação com o aspecto vital da existência humana.
No presente trabalho, mais especificamente, o olhar sob o enfoque da psicoterapia corporal possibilita abordar essa clínica itinerante acontecendo no corpo do indivíduo, uma vez que, corporalmente, o sujeito nos emite sinais sobre os quais podemos intervir em uma prática de AT. Por exemplo, ao nos sugerir a ausência de vitalidade naquele sujeito ou, em outras palavras, uma inibição de sua auto-expressão, tendo em vista que “…toda forma de auto-expressão possui elementos criativos, acarretando prazer e satisfação” (LOWEN, 1984, p. 93).
Aqui também consideramos a proposta de atendimento clínico e a maneira de pensar a clínica do Acompanhamento Terapêutico a partir do resgate da auto-regulação social do sujeito em crise, como conceito central. O enfoque da psicoterapia corporal neo-reichiana, assim, tem como perspectiva a promoção da saúde em termos biopsicossociais.
O objetivo terapêutico do tratamento em AT que procuramos realizar é ajudar o indivíduo a reencontrar-se com o seu corpo, tirando o mais alto proveito possível da vida que o habita. Isso inclui funções elementares de respiração, movimento, sentimento e auto-expressão, favorecendo uma maior aproximação do cliente com essas dimensões de sua personalidade. Assim, o cliente pode estar em circulação pela vida, nas relações sociais, apesar de suas dificuldades de relacionamento com o mundo e consigo mesmo.
O enfoque da psicoterapia corporal
Na psicoterapia corporal, a atitude terapêutica consiste em assumir-se uma postura ativa frente ao cliente. Na relação terapêutica, o terapeuta, diante das resistências evidenciadas, propõe exercícios expressivos, posturas, alongamentos ou intervenções corporais por meio de toques terapêuticos, objetivando trabalhar as tensões musculares do cliente, possibilitando o desbloqueio físico – e, portanto, corporal e emocional – conforme a visão da unidade funcional mente-corpo, que podemos visualizar na diagramação abaixo:
Fontes: REICH (1981, p. 227); LOWEN (1982; p.124)
Consideramos que a aplicabilidade terapêutica do AT, consoante com essa idéia, é possibilitar ao acompanhado uma ampliação de sua auto-expressão, seguindo-o em seus movimentos, dentro do seu universo simbólico e de suas relações sociais.
Partimos do princípio de que o trabalho clínico de AT já é, em si, guiado pelo movimento. Movimento do corpo nas ruas, em casa, no seu local de trabalho, nas idas a locais públicos como praças, lanchonete, cinema, shopping, etc. O terapeuta que realiza o AT escuta as palavras do cliente e observa seus gestos, objetivando o resgate psicossocial, na atividade de uma clínica dinâmica que transita pela cidade e que favorece a auto-regulação no espaço social da pessoa que se encontra em dificuldades.
Conceituando auto-regulação
Wilhelm Reich, estudando e observando minuciosamente a movimentação e funcionamento unicelular (movimentos plasmáticos), constatou a relação com o organismo do indivíduo como um todo. Partindo desse modelo relativamente simples, expandiu também sua visão para a sociedade como um todo e passou a compreender os grupos sociais como organismos “unicelulares” que se relacionam em movimentos de dentro para fora (indivíduo/sujeito influenciando seu meio) e de fora para dentro (os aspectos culturais influenciando os indivíduos). Essa idéia tem suas bases na concepção marxista de sociedade, que influenciou fortemente os estudos de Reich (REICH, 1972).
Reich afirmava que nossas impressões dos movimentos vitais refletem nossa expressão e que as funções básicas da vida são idênticas em toda a matéria viva. Nossas sensações nascem das emoções e brotam de movimentos plasmáticos reais, o que sugere sua objetividade e certeza.
Isso ocorre se o nosso aparelho sensorial não estiver fragmentado, tensionado ou alterado de outra maneira. A fragmentação do aparelho sensorial provoca secções e pontos de tensão. E é sobre esses pontos de secção e tensionamento de partes do corpo que a psicoterapia corporal irá atuar através de exercícios terapêuticos posturais, procurando reintegrá-lo através de uma redistribuição de seu fluxo energético.
O trabalho terapêutico no AT
O objetivo terapêutico, de acordo com o enfoque da psicoterapia corporal neo-reichiana que procuramos delinear neste trabalho, é o de buscar o desbloqueio de tensões no corpo da pessoa que está sendo acompanhada, abrindo caminho para o cliente viver de maneira mais saudável, visto que o efeito esperado será a auto-expressão de suas emoções, a partir do conhecimento de si próprio. É um caminho para a saúde vibrante, ou seja, “por saúde vibrante nós não queremos significar meramente a ausência de doença, mas a condição de estar totalmente vivo” (LOWEN, 1985, p. 15).
Nesse sentido, durante o processo de atendimentos há a possibilidade terapêutica do resgate de um corpo vivo, que se expressa nas situações reais do dia-a-dia, demonstrando a emoção de forma espontânea e com toda sua motilidade, inerente ao estado em que o indivíduo se encontra – uma motilidade inerente ao corpo vivo – auto-regulando-se. Ou seja, o objetivo é auxiliar o indivíduo a estar na vida, apesar de suas dificuldades psíquicas, mesmo as neuroses graves, ou outra indicação para essa clínica.
Exemplo de situação de atendimento
CASO1
Problemática identificada | Ações de AT |
1. Interrupção no fluxo pessoal de desempenho no trabalho: medo das máquinas, irrupção de choro frente às máquinas; perda do senso de auto-eficácia, com sentimentos de incapacidade para o serviço de eletricista; ansiedade extrema; ideação prevalente de ruína, acoplada à idéia de ser demitido; instabilidade da marcha. 2. Dificuldade em ficar de pé, falta de equilíbrio corporal: pés em 3. Sinais físicos de alteração da auto-imagem: descuido com a 4. Encaminhamento para psicoterapia de apoio, prescrita pelo médico psiquiatra. 5. Esposa do cliente sob forte clima de tensão, solicitando orientação da at. 6. Resistência às medicações psiquiátricas: insônia, idéias de ruína prevalentes, tentativa de suicídio e de fuga de casa. 7. Internação mediante o agravamento do quadro e riscos anteriormente relatados. 8. Interrupção temporária dos acompanhamentos e da psicoterapia de apoio, devido ao período de internação do cliente. 9. Momento de internação e alta hospitalar. Viagem de retorno à sua casa. 10. Retorno às atividades cotidianas em casa e no trabalho: insegurança em reassumir a função de eletricista. 11. Dificuldades de ajustes da carga-horária de trabalho do cliente: |
• Contato no seu local de trabalho, procurando apoiá-lo em sua dificuldade de trabalhar como eletricista e sua insegurança frente ao medo de ser demitido. Dada a importância do local de trabalho para o cliente, procurou-se identificar outras funções dentro da empresa, no intuito de preservar seu contato com o ambiente de trabalho. • Oferecimento do próprio corpo do at como suporte físico frente à instabilidade apresentada pelo cliente no andar. • Oferecimento de escuta ativa para suas idéias prevalentes de ruína e temor de demissão. • Acompanhamento do cliente nas consultas com o psiquiatra, • Orientação à família sobre como aumentar mecanismos de vigilância frente ao risco de fuga e suicídio. • Acompanhamento do cliente junto ao psicoterapeuta de apoio, • Estabelecimento de um elo de ligação (“ponte”) entre os demais • Acompanhamento do cliente durante o período de internação e ao • Acompanhamento do cliente às compras em supermercado, bem como ao banco, visando reintegrá-lo em suas atividades diárias. • Esclarecimentos junto à empresa da atual situação de vida do • Apoio à adaptação do cliente em nova função assumida na empresa, • Intercambiando o contato com o psiquiatra, foi possível • Obteve alta do AT e foi iniciada psicoterapia de apoio em consultório. |
Podemos observar, preliminarmente, no quadro apresentado, que houve uma diversidade de locais de atendimento durante o processo terapêutico pelo qual esse cliente evoluiu ao longo de seu tratamento: hospital geral e psiquiátrico, seu local de trabalho, consultórios médicos, locais públicos e sua própria casa. Isso permite visualizar uma importante característica do ato de acompanhar, o qual está diretamente relacionado ao deslocamento do acompanhante/acompanhado até os lugares e nos momentos em que o cliente (ou sua família) necessita de ajuda.
A presença do acompanhante no lar, durante o tratamento, foi valiosa para o oferecimento de apoio às manifestações apresentadas pelo cliente, assim como para as orientações fornecidas à esposa, que se encontrava cotidianamente em contato com as dificuldades apresentadas pelo marido acometido.
A figura da at configurou-se também como apoio corporal, auxiliando o cliente na colocação e firmeza dos pés no contato com o chão, propiciando condições de firmar as pernas e caminhar, apesar do sentimento de insegurança e da instabilidade emocional expressa pela via somática.
Nesse sentido, mediante a abordagem da psicoterapia corporal e procurando significar aquilo que o sujeito comunicava por meio do seu processo de adoecer, a expressão de angústia proveniente da linguagem não-verbal do paciente, uma vez relacionada ao conteúdo verbal, pôde propiciar uma visão articulada da unidade funcional mente-corpo. LOWEN (1982) afirma, a propósito, que processos energéticos do corpo determinam o que acontece na mente, ou seja, há um processo dialético entre corpo e mente em um constante diálogo.
A retomada do processo espontâneo de expansão – representada pela retomada gradual das atividades cotidianas do paciente – foi possível pela articulação de diversas instâncias interligadas, a saber: at-cliente-família-local de trabalho-outros profissionais envolvidos no tratamento.
A reinserção social, ou seja, o resgate da vida social desse cliente foi possibilitada então pela aproximação do acompanhante nas diversas fases do tratamento: acompanhamento no âmbito social, medicação, psicoterapia de apoio, internação, o que configurou uma rede no atendimento às necessidades manifestadas, acompanhando o fluxo dos acontecimentos e o grau de dificuldades evidenciadas em cada etapa do processo de reabilitação social.
Ou seja, procurou-se auxiliar o sujeito na realização daquilo que suas possibilidades lhe permitissem, aproveitando-se do mais alto nível de organização que havia nele em cada momento. Nesse sentido, intervenções por meio de exercícios elementares de respiração, apoio de pés no chão, movimento de corpo pelas caminhadas regulares e incentivo de contatos sociais, apesar das dificuldades encontradas, propiciaram o resgate do movimento auto-expressivo do cliente em seu cotidiano (REICH, 1972; LOWEN, 1982).
O corpo do terapeuta: instrumento de trabalho no AT
O corpo do at pode ser visto como uma ferramenta importante de trabalho, no momento em que se vê colocado a serviço do suporte físico corporal do paciente. Com as mãos apoiando-se nos ombros da at, por exemplo, como o acompanhado fazia quando se manifestava o desequilíbrio em suas pernas ao andar. Em uma outra situação, a acompanhante segurava firmemente nas mãos do cliente, assegurando-o da sua presença ao seu lado no momento da consulta médica, ou a caminho da internação necessária naquele período.
O corpo do terapeuta na psicoterapia corporal é parte integrante da inter-relação paciente-terapeuta, representado nos momentos de suporte do terapeuta ao lado da pessoa que está sendo atendida. Seja pelo olhar interpretativo lançado sobre o seu corpo, seja pelo toque atribuído à necessidade de exercícios realizados no corpo do cliente, as mãos do terapeuta constituem-se em importantes elementos terapêuticos e um recurso a mais na atividade clínica do AT.
LOWEN (1985) afirma que, no trabalho bioenergético sobre o corpo, existem os procedimentos manipulatórios, que consistem em massagem, pressão controlada e toques suaves, objetivando o relaxamento da musculatura e o auxílio no desbloqueio de tensões. Assim, os exercícios se propõem a ajudar a pessoa a entrar em contato com suas tensões e a liberá-las mediante a livre expressão de movimentos.
A base, então, da terapia bioenergética combina o princípio de atividade no nível somático, associada ao procedimento analítico ao nível psíquico. Assim, o paciente adquire novas experiências quando da realização dos movimentos corporais, que trazem memórias afetivas de traumas sofridos em sua história de vida, podendo, então, vislumbrar que, apesar das vivências traumáticas, existe uma carga energética que o colocou na possibilidade de continuar vivo (LOWEN, 1977).
Pautados nesse entendimento, associamos esse modo de pensar às intervenções de movimento em AT. Junto aos acompanhados, mediante os movimentos de deslocamento, podemos auxiliá-los em uma maior aproximação em relação às suas necessidades. Ao lado deles, podemos auxiliá-los a realizar atividades possíveis, respeitando sua condição individual e trabalhando o lado saudável, respeitando a vida.
Analisando os dados de acompanhamentos
A análise dos dados colhidos a partir dos acompanhamentos indicou que o trabalho clínico de AT ocupou um lugar de destaque quanto uma função que se efetiva junto ao indivíduo em sofrimento psíquico em seu ambiente natural.
Foram assinaladas algumas convergências nos atendimentos que se realizaram nesta pesquisa, devido à posição de ponte que o at teve que ocupar dentro das intervenções. Alguns resultados favoráveis foram evidenciados, tais como o retorno ao ambiente de trabalho e a retomada de relações mais positivas com a família.
Observaram-se mudanças em aspectos cotidianos da vida do cliente, apresentado neste trabalho, que construiu uma área de lazer em casa para reuniões com a família, amigos e parentes. Além disso, ele voltou a olhar mais para a vida dos filhos, acompanhando-os nas atividades diárias.
Podemos destacar uma observação mencionada pela esposa deste cliente, quando se referiu ao trabalho do at: “o tratamento parece ter propiciado nele um outro olhar para sua vida própria…” Consideramos que essa é uma reação altamente favorável, como foi a iniciativa de um dos acompanhados em participar do programa de ginástica para a terceira idade na praça, considerando-se tratar-se de uma pessoa que sequer atendia o telefone em casa, dado o grau de depressão em que se encontrava.
Considerações finais
Realizar o trabalho em AT, posicionando-se ao lado da pessoa em dificuldade, aceitando o desafio de acompanhá-la em ambientes externos às instituições tradicionais de tratamento em saúde mental, muitas vezes leva o at a assumir uma identificação com a “diferença”. O profissional se coloca também em uma posição de alta exposição de seu próprio trabalho, ao atender fora dos muros, seja nas ruas ou na residência do cliente, atribuindo ampla elasticidade ao setting terapêutico.
O local de se atender, em Acompanhamento Terapêutico, é o local de onde demanda a dificuldade do cliente. O vínculo terapêutico que se constrói entre at e acompanhado se estabelece no contato entre ambos e situa-se, no aspecto geográfico, em quaisquer lugares em que ocorra a prática clínica do AT.
Como clínica em construção, o Acompanhamento Terapêutico aponta um campo de possibilidades amplas e fecundas para atuação do profissional de saúde. Sujeito que somos de nossos rumos históricos na prática profissional, temos condição de encontrar o nosso foco de atenção em saúde com base nesse novo paradigma, o que em nosso entendimento contribui para o processo de construção coletiva das condições de trabalho na área de saúde mental.
Referências Bibliográficas
BERGER, E. O acompanhar e o acompanhamento terapêutico: formação. In: Encontro dos Estados Gerais da Psicanálise, Anais Eletrônicos, São Paulo, 2001. Disponível em: http://www.estadosgerais.org/encontro/algumas_reflexoes.shtml Acesso em 2 de outubro de 2001.
LOWEN, A Prazer: uma abordagem criativa da vida. (Tradução: Ibanez de Carvalho Filho). São Paulo: Summus, 1984.
LOWEN, A. O corpo em terapia: a abordagem bioenergética. (Tradução: Maria Silvia Mourão Netto). São Paulo: Summus, 1977.
LOWEN, A. & LOWEN, L. Exercícios de bioenergética: o caminho para uma saúde vibrante. (Tradução: Vera Lúcia Marinho, Suzana Domingues de Castro). São Paulo: Ágora, 1985.
MAUER, S. & RESNIZKY, S. Acompanhamento terapêutico e pacientes psicóticos: manual introdutório a uma estratégia clínica. (Tradução: Waldemar Paulo Rosa). Campinas: Papirus, 1987.
REICH, W. Análise do caráter. (Tradução: Maria Lizette Branco, Maria Manuela Pecegueiro). São Paulo, Martins Fontes, 1972.
REICH, W. A função do orgasmo. (Tradução: Maria da Glória Novak). São Paulo: Brasiliense, 1981.